O Governo angolano considerou hoje que a aplicação da Convenção para Eliminação de Formas de Discriminação Racial levanta “questões controversas”, incluindo fenómenos históricos como a escravatura e o colonialismo, e está a capacitar agentes públicos nesse domínio. Capacitar? Onde, como, quem? Agentes do tipo se “haver” necessidade assinaremos um “compromíssio”?
Segundo a secretária de Estado para os Direitos Humanos, Ana Celeste, a aplicação deste instrumento jurídico internacional impõe também “outras questões de importância crucial como problemas enfrentados pelas vítimas e da discriminação dupla”.
O país ratificou a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas das Formas de Discriminação Racial, em Outubro de 2019, através da Resolução da Assembleia Nacional nº35/19, de 9 de Julho.
Falando na abertura de um seminário sobre a Convenção, que decorre em Luanda, Ana Celeste considerou que, apesar dos progressos já realizados, o mundo tem ainda um longo e árduo caminho a percorrer.
“E com o surgimento de novas tecnologias e o advento da globalização, novos desafios se colocam neste domínio, exigindo medidas inovadoras e esforços concertados a nível nacional, regional e internacional”, disse.
Há quase um ano como Estado parte da Convenção, Angola, recordou a governante, deve apresentar um relatório sobre as medidas de carácter legislativo, judiciário, administrativo ou outras que tenha adoptado na concretização das disposições do instrumento.
Elevar a capacidade técnica dos agentes públicos angolanos para um maior conhecimento na elaboração dos relatórios periódicos constitui um dos propósitos do seminário.
O encontro visa igualmente sensibilizar a sociedade angolana sobre a Convenção a partir de uma perspectiva de direitos humanos, acção que decorre no âmbito do Plano de Execução da Estratégia Nacional dos Direitos Humanos.
Angola conta com uma Comissão Intersectorial de Elaboração de Relatórios Nacionais de Direitos Humanos cujos técnicos também participam do seminário promovido pelo Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos com o apoio do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
Apesar dos “progressos na luta contra o racismo” dos últimos 50 anos, “a discriminação racial ainda representa um perigo claro para pessoas e comunidades” em todo o mundo, afirmou em 21 de Março de 2015 o então secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon.
Numa mensagem a propósito do Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial, o então secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon, recordou que, “todos os dias, pessoas de todas as idades suportam ódios, injustiças e humilhação devido à sua cor de pele, origem nacional ou étnica”.
Intitulada “Aprender com as tragédias do passado para combater o racismo hoje”, a mensagem reafirmava o “compromisso” das Nações Unidas “em construir um mundo de justiça e igualdade onde a xenofobia e a intolerância não existem”.
Ban Ki-moon apelava a que se aprenda com os “erros históricos”, como é o caso do colonialismo ou de regimes segregacionista como o do apartheid, na África do Sul, para que se possa “erradicar o preconceito”.
No ano em que a Convenção Internacional para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial celebrava meio século, ainda falta conquistar “a premissa de que todas as pessoas usufruem de direitos iguais e dignidade – independentemente da sua etnia”.
Para que isso aconteça, o secretário-geral da ONU apelou às nações que ratifiquem a convenção internacional e adoptem “leis e políticas fortes que acabem com todas as formas de discriminação”.
No dia 28 de Julho de 2007, na Faculdade de Economia do Porto (Portugal) realizou-se uma conferência sobre o processo eleitoral em Angola. Caetano de Sousa, presidente da Comissão Nacional Eleitoral (CNE), foi o orador principal do evento ao qual compareceram cerca de 200 angolanos de primeira (mensuráveis pela cor e pela filiação no MPLA) e mais meia dúzia de segunda.
O encontro começou com o aplauso da assistência à entrada do então Embaixador de Angola, Assunção Afonso Sousa dos Anjos, bem como das cônsules em Lisboa e no Porto, respectivamente Elisabeth Simbrão e Maria de Jesus dos Reis Ferreira, e ao orador convidado.
Por deficiências sonoras, que nada preocuparam a assistência, pouco se percebeu do que disse o Embaixador ou do que afirmou Caetano de Sousa. Também é certo que, diga-se em abono da verdade, que um angolano (por acaso jornalista) abandonou a sessão no início da intervenção do presidente da CNE.
E abandonou a sessão porque descobriu que, afinal, o seu lugar não era ali. E descobriu isso graças à oportuna explicação de gente ligada à organização, presumivelmente do Consulado no Porto.
Explicamos. No meio dos tais 200 cidadãos presentes estavam pouco mais de meia dúzia de brancos. Durante a sessão, algumas pessoas foram distribuindo pela assistência um pequeno papel que tempos depois recolhiam. Presumiu-se que se tratava de perguntas sobre o processo eleitoral e destinadas aos oradores.
O referido cidadão reparou então (talvez por deficiência profissional) que esses papéis não eram entregues aos cidadãos brancos que, se não eram angolanos eram, pelo menos, amigos de Angola. Não estariam ali como penetras apenas para o faustoso beberete que estava a ser montado para o fim da festa.
Foi então que interpelou uma das pessoas que distribuía os ditos papéis, perguntando-lhe se não tínha direito a um deles.
A resposta foi clara e inequívoca:
“- Isto é só para angolanos”.
A tradução desta afirmação éfoi fácil, já que nenhum dos 200 cidadãos presentes trazia qualquer rótulo a dizer: “Sou angolano”. Ou seja, queria dizer: “Isto é só para angolanos negros”.
Assim sendo, e porque sendo angolano… mas branco, não teve outro remédio que não fosse abandonar a sala. Tristes, é certo. Magoado, é claro. Mas como nada lhe era possível fazer quanto ao local em que nascera, ao país que amava, e muito menos quanto à sua cor, a solução foi ir embora.
Há cerca de dez anos, a tensão racial na África do Sul atingia níveis preocupantes, sobretudo porque os supostos discípulos de Nelson Mandela esqueceram os seus universais ensinamentos.
Nessa altura, dos seguidores do dirigente racista branco sul-africano Eugene Terreblanche nada havia a esperar. Nada de válido. O mesmo não se podia dizer de Julius Malema, então líder da juventude do ANC, partido no poder no país, que parecia cada vez mais um Eugene Terreblanche negro.
Julius Malema, entre muitas outras tentativas de lançar gasolina para a fogueira, continuava a insultar Nelson Mandela, esquecendo – por exemplo – que o ex-presidente sul-africano, pai da pátria e Nobel da Paz, que passou 27 anos nas cadeias sul-africanas por ousar resistir ao regime de minoria branca, afirmava que “está nas nossas mãos criar um mundo melhor para todos os que nele vivem”.
Julius Malema regressou às copas das árvores e resolveu insultar e ameaçar um jornalista da BBC durante uma conferência de imprensa.
O jornalista confrontou Malema com a vida de luxo por ele usufruída, ao mesmo tempo que condenava a riqueza dos brancos. O líder da juventude do ANC, mostrando o seu nanismo intelectual, não gostou e respondeu, visivelmente irritado.
“Não venhas para aqui com essas tendências brancas. Aqui não. Podes fazê-lo noutro lado. Aqui não! Se tens uma tendência para minar negros mesmo no teu trabalho, estás no local errado! Estás no local errado! E podes sair. Põe-te a andar!», disse o membro do ANC.
Perante a estupefacção dos presentes na conferência de imprensa, Malema partiu para o insulto mostrando que, de facto, estava mais perto de Robert Mugabe do que de Nelson Mandela.
“Lixo é o que tu tens nas calças! Isso é que é porcaria O que tens nas calças é que é porcaria. Ouviste? És um miúdo, não sabes fazer nada”, disse o líder da juventude do ANC, bem ao estilo de Eugene Terreblanche.
O jornalista começou a arrumar o material para se retirar e murmurou que não tinha ido ali “para ser insultado”.
“Fora daqui! Sacana!”, vociferou, por fim Julius Malema.
Entretanto, porque ao contrário de Julius Malema, o Congresso Nacional Africano tinha gente que pensa com a cabeça certa, condenou em tom enérgico a forma como o presidente da sua Liga Jovem, se dirigiu ao jornalista da BBC.
Em comunicado então divulgado em Joanesburgo, o partido salientou que ”o comportamento agressivo e insultuoso em relação ao referido jornalista (Jonah Fisher), e que o levou a abandonar a conferência de Imprensa, não pode de forma alguma ser sancionado pelo partido”.
“O comportamento em questão, do presidente da Liga Jovem do ANC, não está de acordo com a cultura e tradições, bem com o código de conduta de um quadro e líder do ANC. Nenhum tipo de alegada provocação dirigida a Julius Malema poderia justificar tal resposta”, dizia o comunicado
Folha 8 com Lusa